O desejo de escrever este texto surgiu do recente episódio envolvendo o atleta Luighi, jogador do Palmeiras sub-20, durante a Copa Libertadores. Por ser um tema sensível, preferi escrevê-lo na minha língua natal, evitando incorrer interpretações errôneas.
O caso ganhou grande repercussão após a presidente do clube, Leila Pereira, magnata do setor financeiro, de maneira, ao meu ver, oportunista, sugerir a desfiliação da Conmebol, além de reivindicar punições mais severas ao clube rival, Cerro Porteño do Paraguai. Esse caso reascendeu o debate sobre a validade de penalizar clubes por atos isolados de seus torcedores, tema que merece uma análise aprofundada. Embora a luta contra o racismo seja um objetivo louvável, responsabilizar uma instituição por atitudes individuais levanta uma série de questionamentos sobre justiça, proporcionalidade e o verdadeiro alcance dessas medidas.
Em primeiro lugar, é importante compreender que um clube esportivo não tem controle total sobre a conduta de todos os seus torcedores. Ainda que campanhas de conscientização possam ser realizadas, a ação de um ou outro indivíduo não reflete, necessariamente, os valores defendidos pela entidade. Punições como perda de pontos, jogos com portões fechados ou multas financeiras acabam penalizando milhares de torcedores inocentes e os próprios jogadores, que não têm participação direta na ofensa.
Outro aspecto a ser considerado é a mudança de percepção entre gerações. Pessoas com 30, 40, 50 anos ou mais cresceram em um contexto em que a resiliência e a capacidade de lidar com ofensas eram vistas como parte da maturidade emocional. Em contrapartida, a geração mais jovem vive em uma era onde qualquer forma de discurso considerado ofensivo é amplamente condenada, o que gera uma baixa tolerância a críticas e provocações. Essa fragilidade emocional é intensificada pelas redes sociais, onde cada ofensa ganha proporções globais e gera reações imediatas e inflamadas.
No Brasil, essa sensibilidade exacerbada com questões raciais se destaca ainda mais em comparação a países vizinhos, onde a abordagem costuma ser mais branda. Enquanto problemas estruturais graves, como pobreza, corrupção e violência, continuam a afetar milhões de brasileiros, o debate racial muitas vezes se transforma em uma tempestade em copo d’água, desviando o foco de questões mais urgentes. Em contrapartida, na Argentina, Uruguai ou Colômbia, a sociedade em geral encara esses episódios com menos radicalismo, inclusive no âmbito das leis, tratando-os como casos isolados e evitando generalizações que prejudiquem coletividades inteiras.
Um exemplo emblemático desse debate é o caso de Vinícius Jr., jogador do Real Madrid. Apesar de não ser o único atleta negro no time, ele é o principal alvo de ofensas racistas em estádios espanhóis. Uma questão pertinente é por que outros jogadores negros do elenco não recebem o mesmo tipo de tratamento. Um fator que não pode ser ignorado é o comportamento provocativo de Vinícius dentro e fora de campo. Suas comemorações exuberantes, desrespeito à equipe de arbitragem, ofensas aos seus colegas de profissão e suas reações às críticas acabam inflamando ainda mais as torcidas adversárias. Isso não justifica, em hipótese alguma, as ofensas racistas, mas ajuda a explicar por que ele se tornou um alvo preferencial.
Em resumo, punir clubes esportivamente por atos isolados de torcedores é uma medida que fere o princípio da individualização da responsabilidade. Além disso, é essencial considerar as diferenças geracionais na forma como as ofensas são encaradas e refletir se o Brasil não está superdimensionando questões raciais em detrimento de problemas sociais mais graves. O caso de Vinícius Jr. evidencia como comportamentos individuais podem intensificar reações hostis, ainda que nada justifique atos de racismo. Um debate mais equilibrado e racional sobre o tema é fundamental para que a busca por justiça não acabe gerando mais injustiças.